Excelência da formação profissional em saúde em Portugal e o impacto da emigração

Oct 28 / Margarete Cardoso
Portugal contribui para a formação de alguns dos melhores profissionais de saúde do mundo. Esta é uma questão inequívoca e reflete-se na classe médica, de enfermagem, mas também nos técnicos superiores de diagnóstico e terapêutica e nos farmacêuticos. E na procura por parte dos mercados externos. Portugal é claramente um país exportador de recursos humanos na área da saúde, muito graças à excelência da sua formação.

Mas que consequências pode ter a emigração em massa de profissionais de saúde para os doentes, para a prestação de cuidados e, sobretudo, para a segurança do doente?

Para Margarete Cardoso, fundadora e CEO da Health UP, a constante saída de profissionais de saúde do país tem uma consequência imediata: "Vai sobrecarregar os profissionais que permanecem em Portugal." A gestora da empresa, vocacionada para a formação e consultoria nas áreas fundamentais da saúde, admite que este é um problema que pode ser mais grave em determinadas regiões do país. A emigração de profissionais de saúde, frisa, "pode agravar as desigualdades no acesso aos cuidados, especialmente em áreas menos desenvolvidas ou onde os serviços já são escassos."

Daniel Costa Pinto, consultor da Direção-Geral da Saúde (DGS), não tem dúvidas de que os profissionais de saúde deixam o país porque "não lhes foram dadas as condições para crescerem. Eles querem mais, são ambiciosos e querem ter boas condições de trabalho", assegura. E, no seu entender, essas condições passam por aspetos bem mais simples do que as condições remuneratórias. Dá alguns exemplos: os profissionais de saúde, afiança, pretendem condições tão básicas como o acesso a um computador totalmente operacional, uma rede de internet de qualidade, uma boa secretária, uma boa cadeira ergonómica e, sobretudo, tempo para estar com o doente. 

Parque estrutural hospitalar sem condições

Um dos problemas identificados por Daniel Costa Pinto diz respeito às condições infraestruturais das unidades de saúde. "Temos um parque estrutural velho, poucos hospitais novos e, mesmo esses, ao fim de cinco anos, estão muito degradados, porque os custos de manutenção são elevadíssimos", explica.

Para o consultor da DGS, Portugal deveria olhar para os excelentes exemplos europeus e tirar daí lições. "Nós vamos à Finlândia, que tem um sistema de saúde similar ao nosso, mas com hospitais de última linha", acrescenta. Daniel Costa Pinto recorda que, em algumas das suas visitas, se deparou com a disponibilização de trotinetas e bicicletas, por exemplo, para os profissionais de saúde se poderem deslocar dentro do hospital. Ou, em Verona, observou que um hospital geriátrico com cerca de 30 a 40 anos seria demolido para construir um novo, pois os custos de construção eram bem mais baixos do que os de reconstrução e manutenção.

"Acho que falta um pouco de coragem política nesta questão das organizações e do parque estrutural", salienta. O consultor lamenta que se continue a demorar 10 a 15 anos para decidir construir um hospital novo ou que se opte pela aglomeração de megacentros hospitalares que, na prática, não representam grandes ganhos para os utentes.    

A diferenciação da nossa formação profissional

Daniel Costa Pinto não tem dúvidas: a formação profissional em Portugal é de excelência e, ao contrário do que muitas vezes transparece nos meios de comunicação social, não se limita aos médicos. "A formação de enfermagem em Portugal é muito valorizada pelos países europeus", refere. "Muitas vezes os profissionais de outros países vêm visitar-nos para ver como funciona a nossa formação, pois há uma diferenciação muito grande face ao que acontece noutros pontos da Europa, por exemplo", refere o consultor.

O mesmo sucede, por exemplo, com os técnicos superiores de diagnóstico e terapêutica que, em Espanha, não obtêm o grau de licenciado, apenas de bacharel. E até ao nível da Medicina, há diferenças substanciais. "O grau de autonomia que é dado aos internos de formação específica é muito diferente no nosso país, havendo uma maior diferenciação técnica, inclusive quando comparado com médicos já com a especialização concluída", especifica.

Portugueses sensibilizados para a segurança do doente

Nos últimos anos, os portugueses ficaram mais sensibilizados para a importância da segurança do doente e para os riscos inerentes à prestação de cuidados de saúde. Margarete Cardoso partilha da opinião que esse conhecimento tem vindo a crescer, mas "ainda há um longo caminho a percorrer."

"O consentimento informado não deve ser apenas um mero documento administrativo ou contratual; os riscos devem ser devidamente explicados aos pacientes", completa Daniel Costa Pinto, acrescentando "que há aqui uma inversão do ónus; os próprios utentes já não se sentem constrangidos em chamar a atenção ao profissional de saúde quando este não desinfeta as mãos depois de interagir com outro doente."

No entanto, o consultor da DGS admite que "a literacia em saúde, a literacia para a segurança e para o que é a saúde, tem de ser ensinada na escola, não apenas aos adultos. É um trabalho que tem de começar desde cedo, até porque, com o Google e a Internet, há um acesso desregulado ao conhecimento sobre saúde." A CEO da Health UP assevera que "é necessário promover uma relação mais colaborativa e incentivar os utentes a questionarem mais os profissionais de saúde." 

Vê o vídeo e assiste a toda a conversa sobre o reflexo que a saída dos profissionais de saúde para o estrangeiro tem na qualidade dos cuidados prestados e ainda se os portugueses estão mais sensibilizados para a importância de garantir a sua segurança enquanto utentes dos serviços de saúde.
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Imagem via Adobe Stock.

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